7.7.11

O Capítulo Final!

Diário de Viagem:

Dia: 7/7/2011

São 12:00pm, encosto a minha cabeça no vidro da van e penso: estou exausto! Olho o Huayna Potosi pela janela, uma nuvem se dissipa e vejo a luz do sol banhar o seu imponente cume de 6088m. Sinto como se a montanha olhasse de volta. Poucas pessoas no mundo sabem o significado daquele lugar. Passo a mão no queixo e sinto a minha barba de duas semanas roçar os meus dedos calejados. Essa barba resume a nossa jornada....esforço, alegrias, sofrimentos, aprendizado, amizade. Olho para o relógio e me dou conta que estou acordado desde o dia anterior, mas parece que se foram dias desde o ataque...


São 00h00, acabamos de acordar. Levantamos antes de todos para ter uma trilha limpa e sem retardatários. E também pelo fato que temos que preparar nosso café antes de sair. Ligo minha headlamp e saio catando tudo que deixei separado no dia anterior. Não dormi quase nada, do meu lado estava uma israelense com mal de altitude tossindo, fungando, chorando e remexendo a noite, quer dizer, a tarde, inteira. Tomo o remédio para dor de barriga e torço para que dure as 8h necessárias para subir e descer já que é a última pastilha. Temos uma hora para nos preparar...

01h15, partida oficial após colocarmos os Crampons nos pés. Tomo o último red bull do nosso estoque após o café da manha. Dividimos a expedição em duas equipes. Uma cordada com o Leo e o Cae, e a outra comigo e o James. Meu coração se aperta, lembro do Thiago (Gira), que passou mal ao subir do acampamento base para o alto e teve que regressar no dia seguinte. Sei o quanto ele queria estar aqui, mas a montanha impõe limites inesperados.

02h25, fazemos a primeira parada, a estratégia é um carboidrato em gel, um gole de água, um gole de gatorade e um pedaço de chocolate a cada stop. Achamos o nosso ritmo, as duas cordadas se separaram, os meninos sumiram na frente e a equipe que estava na nossa cola sumiu lá atrás....

03h25, it's a mind game! tento desviar a minha atenção do desconforto constante...penso no cume e na alegria que terei ao escrever meu nome nas paredes do abrigo alto...

03h40 um escocês nos ultrapassa na trilha com o seu guia. O guia está carregando sua mochila. Eu me lembro da minha camera de 2kg nas costas e mentalmente solto um palavrão.

03h50, o cume não chega nunca, mas tento pensar em outras coisas, recordo de todas as lindas mulheres que tive a honra de conhecer, nos lugares fantásticos que visitei, nos bons amigos que fiz, nas boas refeições que desfrutei, nas fotos que sempre levarei na lembrança, nas boas fortúnias, nas chances de aprendizado, tive uma vida boa, até agora...me perguntam como estou, nao me sinto forte, então não estou bem, mas não vomitei e ainda me consigo me manter em pé, então não estou mal. A única opção é continuar.

04h20 penso nos meus pais, que se foram tão jovens, e há tão pouco tempo, esse cume é para eles também. É uma prova de que posso sobreviver, de que vou dar conta, de que posso me bastar, vou resistir as obstáculos que se apresentarem nessa vida. Quando o ser humano se propõe a alcançar uma meta conta com uma força que como um ima o atraí para sua culminação, essa força se chama vontade.

04h50 Começou a ventar, e ventar muito, estamos caminhando há quase 3h na escuridão total. Porque subimos motanhas? Me recordo de novo: it's a mind game! Tento lembrar de algo feliz...

05h10 quarta parada, estamos exaustos, a subida é interminável! Engulo o último carboidrato em gel. A minha água congelou e o gatorade acabou na última parada. O Marco, nosso guia de repente grita a aponta - Chicos! Esta logo ali!
Olhamos para cima e vemos a sombra do cume. Ele realmente existe! Vamos chegar! Temos que chegar! Somos preenchidos com um novo ânimo que estranhamente nos põe de pé.

05h40 Chegamos ao pé da crista, que é a subida final e mais difícil e técnica até o cume. Encontramos a outra cordada. Léo e Caê estamos em extase. Fizeram o cume e já estão descendo. A alegria de reunir todos é tão grande e meus olhos se enchem de água. A expedição já é um sucesso. Nos abraçamos e eles nos desejam boa sorte. No fundo penso, agora nada vai me impedir! Esse cume é nosso!

05h50 Largamos nossas mochilas na base da aresta para o ataque final, separo a camera, mas ainda não há luz

06h00 o sol nasce e estamos na crista! A vista é indescritível, talvez a mais linda que meus olhos já testemunharam. Os ventos a mais de 100kmh, estamos engantinhando em um aresta fina e qualquer deslize pode resultar em um acidente sério. Não é hora para vacilos. Vamos nos arrastando lentamente e nosso guia Marco não para de gritar um minuto: Cuidado! Em Frente! Seguro! - Já consigo finalmente ver o cume!

06h10 Chegamos! Abraço o james e penso: nossa amizade de 12 anos se fortalece no cume do Huyana Potosi! Não é mais possível conter o choro. O turbilhão de emoções domina! Lutas, sacrifícios, projetos, idéias, conquistas, vivências. Aquele lugar representa tantas coisas e chegar lá te transforma em uma outra pessoa. É como se as referências mudassem, não pelo objetivo, mas pela trajetória até ele. Conquistamos our first mountain! Me recordo de todos aqueles que nos ajudaram a chegar lá e silenciosamente lhes envio um Muito Obrigado dos 6088m.

06h30 É hora de descer! Uma energia mística nos dá força e descemos com sorrisos estampados na cara. Uma sensação de dever cumprido nos domina.

06h45 o vento na crista aumentou e somos balançados como roupas num varal. O cuidado é redobrado e agora com mais luz percebo o quão estreita é a crista e que roubada é passar por ela.

07h30 James comenta que de noite não parece que passamos por todos esses lugares e o guia responde: porque você acha que atacamos a noite?

09h30 chegamos ao acampamento alto e encontramos nossos companheiros nos sacos de dormir. Risadas, histórias, roubadas e milhões de comentários sobre o sucesso da expedição. Aos poucos os outros montanhistas vão chegando e o abrigo vira uma festa de conversas paralelas. Os mais fortes ajudam os mais fracos a se recuperar. Não temos mais água, mas encontramos um saco de maçãs que é dividido entre todos. Sem dúvidas, foi a melhor maçã da minha vida! Temos 30min para descansar antes de descer com tudo.

10h00 após arrumar tudo correndo, me pergunto porque não temos um porteador para descer nossas coisas. A cargueira de 90L parece ainda mais pesada após o cume...

11h30 descanso encostando a cabeça nos bastonetes amaldiçoando a trilha mista de neve e pedras soltas. Os quase-tombos são uma constante na última hora...já posso ver o acampamento base!

12h00 encosto a cabeça no vidro da van e penso: Estou exausto! Mas estou muito, muito feliz! Adeus Huayna Potosi!




exaustos no cume...





descansando na descida....




7 comentários:

  1. Vc é foda!!!! Te admiro muito e ainda bem que vieo como meu irmão! Estou abarrotada de orgulho por vc!!!! Parabéns!!! Que venham muitos outros projetos, nutridos de conhecimento e segurança!!!

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  2. Foda é pouco!!! São poucas as pessoas que traçam as metas, definem as estratégias, vão em busca do sonho e o realizam!
    E vcs fizeram isso!!!aproveite tudo que a experiência pode oferecer, conscientemente! O preparo, o durante e a conquista!!! Amo vc Bruno Senna! Esse sabor da conquista é seu! Beijos!

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  3. Parabéns amigos pelo cume!! Realmente esse mundo das altas montanhas é encantador né... E o relato ficou muito bom Bruno!
    Au revoir!

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  4. Nossa companheiro! Este relato ficou de emocionar. to aqui revivendo estas horas inesqueciveis. Ja ja chego em bh praquela cerva e escrevo um relato da dupla de apressadinhos aqui! Vees algo?

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  5. Parabéns moçada! sou de bh também, já estive nesse lugar mas não tive a aportunidade de atacar essa montanha.

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  6. Meu amigo, que conquista incrível! Descobri seu blog por acaso. Vou à Bolívia em maio, mas não escalo ainda. Espero poder voltar dentro de um ano e conquistar o Huayna Potosí. A cada relato que leio sobre ele, me encho mais de vontade. E o seu está repleto de detalhes e bastante emocionante. Parabéns pelo esforço e conquista. Já ouvi uma outra resposta para a sua pergunta, e que talvez você já conheça também: "por que subimos montanhas? porque elas estão lá!". Um abraço e caso tenha algum outro evento em BH do tipo que teve no Café com Letras divulgue por aqui.

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